Contrato de fiança

 

 

A fiança é um contrato acessório em relação ao contrato principal pelo qual o fiador se responsabiliza pela dívida do devedor junto ao credor. A responsabilidade do fiador é subsidiária, salvo se estipular solidariedade entre este e o devedor principal, nos termos do art. 828, II do Código Civil de 2.002.

 

O fiador, quando assume a obrigação de garantir um contrato de locação, fica responsável nos exatos termos em que se obrigou e, se vier a ser acionado judicialmente para responder pela dívida, seus bens poderão ser penhorados. Há entendimento jurisprudencial e doutrinário no sentido de que todos os bens do fiador podem ser penhorados, inclusive, seu único imóvel destinado à sua moradia ou de sua família.

 

Podem ser fiadores todos aqueles que são maiores ou emancipados e com direito à livre disposição dos seus bens. O cônjuge, sem outorga uxória (anuência expressa), não poderá assumir esta responsabilidade, exceto no regime da separação absoluta de bens, regulada no artigo 1.647 do código atual. A ausência da outorga uxória, não suprida pelo juiz, torna ato anulável. O cônjuge interessado em se eximir da responsabilidade da fiança pode pleitear judicialmente a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade conjugal.

 

O benefício de ordem é um direito que tem o fiador de só responder pela dívida se primeiramente foi acionado o devedor principal e este não cumprir a obrigação de pagar. Segundo as disposições do atual Código Civil, constantes no artigo 827, que manteve a mesma redação do artigo 1.491 do Código antigo, o devedor tem direito a exigir, até a contestação da lide, que primeiro sejam executados os bens do devedor. E o parágrafo único do mencionado artigo diz que: “O fiador que alegar o benefício de ordem a que se refere este artigo, deve nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e desembargados, quantos bastem para solver o débito”.

 

Nesse contexto, caso o devedor principal não cumpra a obrigação e o fiador venha a ser acionado para responder pela dívida, sem que antes tenha sido acionado aquele, poderá alegar o benefício de ordem para que os bens do devedor sejam excutidos em primeiro lugar, salvo se foi estipulada solidariedade, situação que permite ao credor cobrar a dívida tanto do devedor principal como do fiador.

 

No que diz respeito à exoneração da fiança, primeiramente, deve-se analisar se o contrato foi assinado por tempo determinado ou indeterminado, pois no primeiro caso a fiança se extingue no momento em que se dá por encerrado o prazo contratado. No segundo caso, o fiador permanecerá responsável enquanto o contrato estiver vigorando, mas em ambos os casos o fiador pode dela se exonerar.

 

Nos termos do artigo 835 do Código atual, ainda que a fiança não tenha limite temporal, poderá o fiador dela se exonerar se assim lhe convier, responsabilizando-se, porém, por todos os efeitos dela decorrentes, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante sessenta dias após a notificação ao credor.

 

Observa-se pela redação do artigo 835 do novo Código (artigo 1.500 do Código anterior), que o fiador poderá se exonerar da fiança sempre que lhe aprouver e de maneira bem mais simplificada, bastando para tanto enviar uma notificação ao credor cientificando-o da sua decisão. O espaço de tempo de sessenta dias, determinado pelo legislador, é tempo hábil para que o devedor possa constituir novo fiador.

 

Uma questão que pode suscitar dúvida em relação à exoneração da fiança decorre da redação do artigo 39 da Lei do Inquilinato nº 8.245/91, que assim dispõe: “Salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel". Conforme se observa da redação, pactuada a garantia da fiança até a entrega do imóvel o fiador é responsável até o cumprimento do termo.

 

Todavia, se o contrato vier a se prorrogar por prazo indeterminado, sem a sua anuência expressa, deve ser aplicada a regra do artigo 835 do novo Código que diz que o fiador pode se exonerar imediatamente da fiança, bastando para tanto, o envio de uma notificação de exoneração ao credor.

 

Importante ressaltar que, se um contrato foi assinado por tempo determinado e vindo a se transmudar para tempo indeterminado, o fiador deve ser comunicado para que manifeste a sua concordância em continuar ou não a prestar fiança. Caso não haja a expressa manifestação de vontade do fiador, ainda que conste no contrato a cláusula escrita de não renunciar, esta cláusula não deve prevalecer.

 

A doutrina é majoritária no sentido de que a referida cláusula deve ser recebida com reservas, posto que significaria aceitar a duração indefinida da fiança, ainda que contrariamente se manifestasse o fiador. E a jurisprudência pátria já se manifestou nesse sentido: “Ainda que haja cláusula de duração da responsabilidade do fiador até a concreta entrega das chaves, pode se exonerar da fiança por sua conveniência se o contrato sobre que ela incidir se determinar no tempo” (Lex-JTA 146/291).

 

No mesmo sentido a Súmula nº 214 do Superior Tribunal de Justiça - "O fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu". A referida súmula está em perfeita sintonia com a disposição do artigo 819 do Código Civil atual que assim dispõe: “A fiança dar-se-á por escrita, e não admite interpretação extensiva”.

 

Nesse entendimento, se o fiador prestou fiança em contrato por tempo determinado e se prorrogou por tempo indeterminado, sem a sua anuência em relação aos termos da fiança, tem ele o direito de se desobrigar por meio da notificação, nos termos do artigo 835 acima mencionado.

São Paulo, 30 de junho de 2.003.

 

Valdirene Laginski

Advogada do escritório Pacheco Neto Sanden e Teisseire Advogados, com atuação nas áreas cível e trabalhista.

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