Os bancos e o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90)

 

Inicialmente cabe ressaltar que o Código de Defesa do Consumidor incide apenas sobre a relação de consumo, ou seja, quando de um lado figura o consumidor (ou quem lhe seja equiparado) e de outro o fornecedor, tendo como objeto a aquisição de um produto ou a utilização de um serviço, e, conforme disposição do parágrafo segundo do artigo 3º, do referido diploma legal, “serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária......”

 

Portanto, as disposições do CDC se aplicam aos contratos bancários, por serem as operações bancárias relações que tratam do consumo e envolvem consumidores, sendo que as relações bancárias e as relações de consumo se encontram nos mesmos patamares. Não há que se discutir acerca desta relação de consumo e a aplicação do CDC nos contratos assinados entre o cliente (pessoa física) e o estabelecimento bancário, pois este age como prestador de serviço, caracterizando uma relação de consumo. Nesse sentido a jurisprudência já entendeu: “O CDC rege as operações bancárias, inclusive as de mútuo ou de abertura de crédito, pois trata-se de relação de consumo. O produto da empresa de banco é o dinheiro ou o crédito, bem juridicamente consumível, sendo, portanto, fornecedora; e o consumidor, o mutuário ou creditado” (Ap. Cível nº 193051216 – 7ª Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul – j. 19.05.93).


Controvérsia há no que diz respeito à finalidade dos contratos realizados com as instituições bancárias. Em sendo o consumidor destinatário final do crédito ou dinheiro tomado do banco, haverá relação de consumo, com presunção “juris tantum” em favor do consumidor, caso contrário, isto é, se se tratar de pessoa jurídica, esta não será considerada destinatária final o que descaracteriza a relação de consumo abrangida pelo CDC, cabendo-lhe o ônus da prova em demonstrar que no contrato celebrado com o banco agiu como destinatária final.

 

Arnoldo Wald entende que “não é possível que o crédito seja usado por um destinatário final, já que, por sua própria natureza, destina-se à circulação como meio de pagamento”, o que afasta a incidência do Código de Defesa do Consumidor (in O Direito do Consumidor e suas Repercussões em Relação às Instituições Financeiras – RT 666, Abril de 1991, p. 7-17).


O entendimento de que o crédito ou dinheiro reutilizado no mercado para adquirir bens ou serviços, descaracteriza a relação de consumo e afasta a incidência das normas do CDC, não pode ser aceito, pois nenhuma interpretação pode conduzir ao absurdo, vez que estaria obrigando o consumidor pessoa física que tomou dinheiro emprestado do banco a dele não se utilizar, sob pena de se descaracterizar a referida relação de consumo. Claro está que o dinheiro emprestado deverá circular, e o fato de o consumidor aplicá-lo em bens ou serviços, de forma alguma deve descaracterizá-lo como destinatário final. E mais, os contratos realizados com as instituições bancárias são contratos de adesão, aplicáveis, portanto, as disposições do Código de Defesa do Consumidor. A alegação dos bancos de que os clientes-correntistas assinam voluntariamente os contratos, com oportunidade de discutir as cláusulas contratuais não pode prevalecer, uma vez que as taxas de juros e serviços já são pré-fixadas, ou o consumidor as aceita e assina o contrato ou não obtém o crédito ou o dinheiro desejado.


O CDC é uma das maiores conquistas dos consumidores, as relações de consumo na última década só fizeram melhorar. O consumidor descobriu que está amparado e vem reclamando cada vez mais dos abusos cometidos por determinadas instituições. Não é justo tirar essa conquista deixando os bancos fora do manto do CDC.

 

Valdirene Laginski

Advogada do escritório Pacheco Neto Sanden e Teisseire Advogados, com atuação nas áreas cível e trabalhista.

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